quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Che Guevara - Pronunciamento ao Conselho Interamericano de Estudos Sociais - 8 de agosto de 1961) - Parte II

Pronunciamento diante do CIES (Conselho Interamericano de Estudos Sociais)
(8 de agosto de 1961) 


Segunda parte


Senhor delegado de Cuba: Bem, senhor Presidente. 

É necessário explicar o que é a Revolução cubana, o que é este fato especial que fez ferver o sangue dos impérios do mundo e também ferver o sangue, mas de esperança, dos despossuídos do mundo, pelo menos. 

É uma Revolução Agrária, anti-feudal e antiimperialista, que foi se transformando imperiosamente, por conta de sua evolução interna e de suas agressões externas, em uma revolução socialista e que a proclama assim, diante da face da América: Uma revolução socialista. Uma revolução socialista que tomou a terra do que tinha muito e a deu ao que estava assalariado nessa terra, ou a distribuiu em cooperativas entre outros grupos de pessoas que não tinham nem sequer terra onde trabalhar, mesmo que fosse como assalariado. 

É uma revolução que chegou ao poder com seu próprio exército e sobre as ruínas do exército da opressão; que sentou no poder, olhou ao seu redor, e dedicou-se, sistematicamente, a destruir todas as formas anteriores de ditaduras de uma classe exploradora sobre a classe dos explorados, destruiu o exército totalmente, como casta, como instituição, não como homens, salvo os criminosos de guerra, que foram fuzilados. Também em face à opinião pública do continente e com a consciência bem tranquila. 

É uma revolução que reafirmou a soberania nacional e, pela primeira vez, apresentou para si e para todos os povos da América, e para todos os povos do mundo, a reivindicação dos territórios injustamente ocupados por outras potências. 

É uma revolução que tem uma política externa independente, que vem aqui, a esta reunião de Estados Americanos, como mais um entre os latino-americanos; que vai à reunião dos países não alinhados como um de seus membros importantes e que senta nas deliberações com os países socialistas, que a consideram como um país irmão. 

É, pois, uma revolução com características humanistas. É solidária com todos os povos oprimidos do mundo; solidária, senhor Presidente, porque também dizia Martí: «Todo homem verdadeiro deve sentir na face o golpe dado a qualquer face de um homem.» E cada vez que uma potência imperial avassala um território, está dando uma bofetada em todos os habitantes desse território. 

Por isso nós lutamos pela independência dos países, lutamos pela reivindicação dos territórios ocupados. Apoiamos o Panamá, que tem um pedaço de seu território ocupado pelos Estados Unidos. Chamamos de Ilhas Malvinas, e não de Falkland, às do sul da Argentina, e chamamos de Ilha do Cisne àquela que os Estados Unidos arrancaram de Honduras e de onde nos está agredindo por meios telegráficos e radiofônicos. 

Lutamos constantemente aqui, na América, pela independência das Guianas e das Antilhas Britânicas, onde aceitamos o fato da independência de Belize, porque a Guatemala já renunciou a sua soberania sobre esse pedaço de seu território; e lutamos também na África, na Ásia, em qualquer lugar do mundo onde o poderoso oprime ao mais fraco, para que o mais fraco alcance sua independência, sua autodeterminação e seu direito a organizar-se como Estado soberano. 

Nosso povo, permitam que lhes digamos, quando da ocasião do terremoto que assolou o Chile, buscou ajudá-lo na medida de suas forças, com seu produto único, com o açúcar. Uma ajuda pequena, mas que, entretanto, foi uma ajuda que não exigia nada; foi simplesmente a entrega ao país irmão, ao povo irmão, de algo de alimento para suportar essas horas angustiosas. Nem nos tem que agradecer por nada esse povo e, ainda menos, nos deve algo. Nosso dever fez que entregássemos o que entregamos. 

Nossa revolução nacionalizou a economia nacional, nacionalizou todo o comércio exterior, que está agora em mãos do Estado, e dedicou-se a sua diversificação, comercializando com todo o mundo; nacionalizou o sistema bancário para ter em suas mãos um instrumento eficaz para exercer tecnicamente o crédito de acordo com as necessidades do país. Faz seus trabalhadores participarem na direção da economia nacional planificada e realizou, faz poucos meses, a Reforma Urbana, por meio da qual entregou a cada habitante do país a casa onde residia, tornando-o dono dela com a única condição de pagar o mesmo que estava pagando até esse momento, de acordo com uma tabela, durante determinado número de anos. 

Tomou muitas medidas de afirmação da dignidade humana, incluindo entre as primeiras a abolição de a discriminação racial, que existia, senhores delegados, de uma forma sutil, mas existia. As praias de nossa ilha não serviam para que se banhassem o negro nem o pobre, porque pertenciam a um clube privado, e vinham turistas de outras praias, que não gostavam de se banharem com os negros. 

Nossos hotéis, os grandes hotéis de Havana, que eram construídos por companhias estrangeiras, não permitiam que dormissem negros ali, porque os turistas que vinham de outros países não gostavam de negros. 

Assim era nosso país; a mulher não tinha nenhuma sorte de direito igualitário; ganhava menos por trabalho igual, era descriminada como na maioria de nossos países americanos. 

A cidade e o campo eram duas zonas em permanente luta e dessa luta o imperialismo extraía a força de trabalho suficiente, a ser mal paga e com atraso. 

Nós realizamos uma revolução nisso tudo e realizamos, também, uma autêntica revolução na educação, cultura e saúde. Neste ano, será eliminado o analfabetismo em Cuba. Cento e quatro mil alfabetizadores de todas as idades alfabetizam um milhão e duzentos e cinquenta mil analfabetos, porque em Cuba realmente havia analfabetos, muitos mais de os que as estatísticas oficiais de tempos anteriores diziam. 

Este ano, o ensino primário será gratuito e obrigatório, convertemos os quartéis em escolas; realizamos a reforma universitária, dando livre acesso a todo o povo à cultura superior, às ciências e à tecnologia moderna, fizemos uma grande exaltação dos valores nacionais, diante da deformação cultural produzida pelo imperialismo e as manifestações de nossa arte recebem os aplausos de todos os povos do mundo de todos não, em alguns lugares não deixam que entrem—, exaltação do patrimônio cultural de toda nossa América Latina, que se manifesta em prêmios anuais dados a literatos de todas as latitudes de América, e cujo premio de poesia, senhor Presidente, foi ganho pelo renomado poeta Roberto Ibáñez [1], no último confronto; estendemos a função da medicina em benefício de camponeses e trabalhadores urbanos humildes; esportes para todo o povo, [política] que se reflete em 75 000 pessoas desfilando no 25 de julho em uma festa desportiva realizada em homenagem ao primeiro cosmonauta do mundo, Yuri Gagarin; a abertura das praias populares, a todos, evidentemente, sem distinção de cor nem de ideologia e, além disso, gratuita; e os círculos sociais operários, nos que foram transformados todos os círculos exclusivistas de nosso país, que eram muitos. 

Bem, senhores técnicos, companheiros delegados, chegou a hora de se referir à parte econômica das discussões. O ponto I é muito amplo. Feita também por técnicos muito inteligentes é a planificação do desenvolvimento econômico e social na América Latina. A primeira incongruência que observamos no trabalho é expressa nesta frase: «Às vezes é expressa a ideia de que um aumento no nível e diversidade da atividade econômica acarreta necessariamente na melhoria das condições sanitárias. Entretanto, o grupo é da opinião de que a melhoria das condições sanitárias não somente é desejável em si mesma, mas constitui um requisito essencial, prévio ao crescimento econômico, e deve formar, assim, parte essencial dos programas de desenvolvimento da região.»

Isso, por outro lado, encontra-se refletido, também, na estrutura dos empréstimos do Banco Internacional de Desenvolvimento, pois na análise que fizemos dos 120 milhões emprestados em primeiro lugar, 40 milhões, isto é, um terço, correspondem diretamente a empréstimos desse tipo; para casas de habitação, para aquedutos, redes de esgoto. 

É um pouco... eu não sei, mas eu qualificaria quase como uma condição colonial. Tenho a impressão de que se pensa fazer a latrina como uma coisa fundamental. Isso melhora as condições sociais do pobre índio, do pobre negro, do pobre individuo que vive em uma condição subumana; «vamos a fazer-lhe latrinas e então, depois que lhe façamos latrinas, e depois a que a sua educação tenha permitido que a mantenha limpa, então poderá gozar dos benefícios da produção.» Porque é notável, senhores delegados, que o tema da industrialização não figura na análise dos senhores técnicos. Para os senhores técnicos, planificar é planificar a latrina. O resto, quem sabe quando que será feito! 

Se me permite o senhor Presidente, lamentarei profundamente, em nome da delegação cubana, ter perdido os serviços de um técnico tão eficiente como o que dirigiu este primeiro grupo, o doutor Felipe Pazos. Com sua inteligência e sua capacidade de trabalho, e nossa atividade revolucionária, em dois anos Cuba seria o paraíso da latrina, mesmo se não tivéssemos nenhuma das 250 fábricas que estamos começando a construir, mesmo se não tivéssemos feito a Reforma Agrária. 

Eu me pergunto, senhores delegados, se não se pretende tirar sarro, não de Cuba,— porque Cuba está à margem, já que a Aliança para o Progresso [2] não está com Cuba, mas contra ela, e não é estabelecido dar sequer um centavo a Cuba—, mas sim de todos os outros delegados. 

Não há um pouco de impressão de que lhes estão tirando sarro? Dão-se dólares para fazer estradas, dão-se dólares para fazer caminhos, dão-se dólares para fazer esgotos; senhores, com o que são feitos os esgotos? Não é preciso ser um gênio para isso. Por que não se dão dólares para equipamentos, dólares para maquinarias, dólares para que nossos países subdesenvolvidos, todos, possam converter-se em países industriais, agrícolas, de uma vez? Realmente, é triste. 

Na página 10, nos elementos de planificação do desenvolvimento, no ponto VI, é estabelecido quem é o verdadeiro autor deste plano. 

Diz o ponto VI: «Estabelecer bases mais sólidas para a concessão e utilização de ajuda financeira externa, especialmente o proporcionar critérios eficazes para avaliar projetos individuais.»

Nós não vamos estabelecer as bases mais sólidas para a concessão e utilização, porque nós não somos, são os senhores os que recebem, não os que concedem, e nós quem olhamos, e os que concedem são os Estados Unidos. Então, este ponto VI é redigido diretamente pelos Estados Unidos e este é o espírito de toda esta construção chamada ponto I. 

Mas bem, quero fazer constar uma coisa; falamos muito de política, denunciamos que há aqui uma confabulação política; em conversas com os senhores delegados pontuamos o direito de Cuba da expressar estas opiniões, porque se ataca diretamente Cuba no ponto V. 

Entretanto, Cuba não vem, como dizem alguns jornais o muitos porta-vozes de empresas de informação estrangeira, para sabotar a reunião. 

Cuba vem para condenar o condenável a partir do ponto de vista dos princípios, mas vem também para trabalhar harmonicamente, se é que é possível, para conseguir corrigir isto, que nasceu muito torto, e está disposta a colaborar com todos os senhores delegados para corrigi-los e fazer um bonito projeto. 

O honroso senhor Douglas Dillon [3], em seu discurso, citou o financiamento, porque é importante. Nós, para que nos juntemos todos para falar de desenvolvimento, temos que falar de financiamento, e todos nos juntamos para falar com o único país que tem capitais para financiar. 

Diz o senhor Dillon: «Olhando nos anos vindouros todas as fontes de financiamento externo entidades internacionais, Europa e Japão, assim como a América do Norte, os novos investimentos privados e os investimentos dos fundos públicos—, se a América Latina toma as medidas internas necessárias, condição prévia, poderá logicamente esperar que seus esforços» — não é tampouco que, se toma as medidas, está feito, mas sim que «poderá logicamente esperar» —, «serão igualados por um fluxo de capitais da ordem de pelo menos 20 bilhões de dólares nos próximos dez anos. E a maioria desses fundos procederão de fontes oficiais.»

Isto é o que há? Não, o que há são 500 milhões aprovados, isto é do que se fala. Bem, há que pontuar isto bem, porque é o centro da questão. O que querem dizer? —E eu garanto que não pergunto por nós, mas sim pelo bem de todos. O que quer dizer «se a América Latina toma as medidas internas necessárias» e o que quer dizer «poderá logicamente esperar»? 

Acredito que depois, no trabalho das comissões ou no momento em que o representante dos Estados Unidos julgue oportuno, haverá que deixar um pouco mais claro este detalhe, porque 20 bilhões é uma cifra interessante. É nada menos que 2/3 da cifra que nosso Primeiro Ministro anunciou como necessária para o desenvolvimento da América; um pequeno empurrãozinho e chegamos aos 30 bilhões. Mas é preciso chegar a esses 30 bilhões contantes y sonantes [4], um a um, nos tesouros nacionais de cada um dos países da América, menos esta pobre cinderela, que, provavelmente, não receberá nada. 

Aí é onde nós podemos ajudar, não num plano de chantagem, como se está afirmando, porque é dito: não, Cuba é a galhinha dos ovos de ouro, está Cuba [presente], enquanto Cuba estiver [presente], os Estados Unidos dão. Não, nós não viemos com esse intuito, nós viemos trabalhar, tentar lutar no plano dos princípios e das ideias, para que nossos povos se desenvolvam, porque todos ou quase todos os senhores representantes lhe disseram: se a Aliança para o Progresso fracassa, nada pode deter as ondas dos movimentos populares; se a Aliança para o Progresso fracassa, e nós estamos interessados em que não fracasse, na medida em que signifique para América uma real melhoria nos níveis de vida de todos os seus 200 milhões de habitantes. Posso fazer esta afirmação com honestidade e com toda a sinceridade. 

Nós diagnosticamos e previmos a revolução social na América, a verdadeira, porque os acontecimentos estão desenvolvendo-se de outra forma, porque há a pretensão de frear os povos com baionetas e quando o povo sabe que pode tomar as baionetas e voltá-las contra quem as empunha, já está perdido quem as empunha. Mas se o caminho dos povos quer se levar a partir deste do desenvolvimento lógico e harmônico, pelos empréstimos a longo prazo, com juros baixos, como anunciou o senhor Dillon, com 50 anos de prazo, também nós estamos de acordo. 

O único, senhores delegados, é que todos juntos temos que trabalhar para que aqui seja efetivado esse valor e para garantir que o Congresso dos Estados Unidos a aprove; porque que não se esqueçam que estamos diante de um regime presidencial e parlamentar, não é uma ditadura como Cuba onde aparece um senhor representante de Cuba, fala em nome do governo, e há responsabilidade de seus atos; aqui, além disso, tem que ser ratificado ali, e a experiência de todos os senhores delegados é que muitas vezes não foram ratificadas ali as promessas que se fizeram aqui... 

A taxa de crescimento que é apresentada como uma coisa belíssima para toda a América é de 2,5% de crescimento líquido [5]. A Bolívia anunciou 5% para 10 anos, nós parabenizamos o representante da Bolívia e lhe dizemos que com um pouquinho de esforço e de mobilização das forças populares, pode falar em 10%. Nós falamos em 10% de desenvolvimento sem medo algum, 10% de desenvolvimento é a taxa que Cuba prevê nos anos vindouros. 

O que isto indica, senhores delegados? Que se cada um vai pelo caminho que vai, quando a América, que atualmente tem aproximadamente [uma renda] per capita de 330 dólares, vê crescer seu produto líquido em 2,5%, vai ter 500 dólares lá pelo ano de 1980, 500 dólares per capita. Claro que para muitos países é um verdadeiro fenômeno. O que pensa ter Cuba no ano 1980? Pois uma renda líquida per capita de uns 3 mil dólares; mais que os Estados Unidos. E se não acreditam em nós, perfeito, aqui estamos [dispostos] para a competição, senhores. Que nos deixem em paz, que nos deixem desenvolver e que daqui a 20 anos venhamos todos de novo, para ver se o canto da sereia era o da Cuba revolucionária ou era outro. Mas nós anunciamos, responsavelmente, essa taxa de crescimento anual. 

Os especialistas sugerem a substituição de ineficientes latifúndios e minifúndios por fazendas bem equipadas. Nós dizemos: querem fazer a Reforma Agrária? Tomem a terra dos que têm muita e a deem ao que não tem. Assim se faz a Reforma Agrária. O resto é canto de sereia. A forma de fazê-la; se é entregue um pedaço de parcela, de acordo com todas as regras da propriedade privada; se é feita em propriedade coletiva; se é feito um meio-termo — como o temos nós—, isso depende das peculiaridades de cada povo; mas a Reforma Agrária se faz liquidando os latifúndios, não indo colonizar lá longe. 

E, assim, poderia falar da redistribuição da renda que em Cuba se fez efetiva, porque é tirado dos têm mais e lhes é permitido ter mais aos que não têm nada ou aos que têm menos, porque fizemos a Reforma Agrária, porque fizemos a Reforma Urbana, porque baixamos as tarifas elétricas e telefônicas — que, entre parênteses, esta foi a primeira escaramuça com as companhias monopolistas estrangeiras, porque fizemos círculos sociais operários e círculos infantis, onde os filhos dos operários vão receber alimentação e vivem enquanto seus pais trabalham; porque fizemos praias populares e porque nacionalizamos o ensino, que é absolutamente gratuito. Além disso, estamos trabalhando em um amplo plano de saúde. 

De industrialização falarei à parte, porque é a base fundamental do desenvolvimento e assim o interpretamos nós. 

Mas há um ponto que é muito importante —é o filtro, o purificar, os técnicos, acredito que são sete, de novo, senhores, — o perigo da latrinocracia, enfiado no meio dos acordos com os que os povos querem melhorar seus níveis de vida; outra vez políticos disfarçados de técnicos dizendo: aqui sim e aqui não; porque você fez tal coisa e tal coisa, sim, mas na realidade, porque és um fácil instrumento de quem dá os meios; e a ti não, porque fizeste isto mal; mas, na realidade, porque não és instrumento de quem dá os meios, porque dizes, por exemplo, que não podes aceitar como preço de algum empréstimo que Cuba seja agredida. 

Esse é o perigo, sem contar que os pequenos, como em todos os lugares, são os que recebem pouco ou nada. Há, senhores delegados, um só lugar onde os pequenos têm direito ao «pataleo» [6], e é aqui, onde cada voto é um voto, e onde isso há que votá-lo, e podem os pequenos, —se têm a atitude de fazê-lo—, contar com o voto militante de Cuba contra as medidas dos «sete», que são esterilizantes, purificantes e almejam canalizar o crédito com disfarces técnicos por caminhos diferentes. 

Qual é a posição que verdadeiramente conduz a uma autêntica planificação, que deve ter coordenação com todos, mas que não pode estar sujeita a nenhum outro organismo supranacional? Nós entendemos — e assim o fizemos em nosso pais — senhores delegados, que a condição previa para que haja uma verdadeira planificação econômica é que o poder político esteja nas mãos da classe trabalhadora. Esse é o sine qua non [7] da verdadeira planificação para nós. Além disso, é necessária a eliminação total dos monopólios imperialistas e o controle estatal das atividades produtivas fundamentais. Amarrados bem a esses três cabos, passa-se à planificação do desenvolvimento econômico; se não, tudo será perdido em palavras, em discursos e em reuniões. 

Além disso, há dois requisitos que permitirão fazer ou não que este desenvolvimento aproveite as potencialidades dormentes no seio dos povos, que estão esperando acordar. São, por um lado, o da direção central racional da economia por um poder único, que tenha possibilidades de decisão.— Não estou falando de possibilidades ditatoriais, mas sim de possibilidades de decisão — e, por outro, o da participação ativa de todo o povo nas tarefas da planificação. Naturalmente, para que todo o povo participe nas tarefas da planificação, terá que ser todo o povo dono dos meios de produção, se não, dificilmente participará. O povo não quererá, e os donos das empresas onde trabalha, acredito que tampouco.

Bem, podemos falar uns minutos do que Cuba obteve em seu caminho, comercializando com todo o mundo, «indo pelas vertentes do comércio», dizia Martí. 

Nós temos assinados, até o presente momento, créditos de 357 milhões de dólares com os países socialistas e estamos em conversações — que são conversações de verdade — por cento e quarenta e pouco milhões a mais, com os quais chegaremos aos 500 milhões em empréstimos nestes cinco anos. 

Esse empréstimo, que nos dá a posse e o domínio de nosso desenvolvimento econômico, chega, como dissemos, aos 500 milhões— o valor que os Estados Unidos dão à América como um todo somente para nossa pequena república. Isto, referente à República de Cuba, transposto para a América, significaria que os Estados Unidos, para proporcionar ou para fazer o mesmo trabalho, teria que dar 15 bilhões de dólares falo de pesos a dólares, porque em nosso país valem o mesmo. 

Trinta bilhões de dólares em dez anos; a cifra que nosso Primeiro Ministro solicitara e, com isso, se há uma acertada condução do processo econômico, a América Latina, em somente cinco anos, seria outra coisa. 
Continua
 
Traduzido pela equipe do Fuzil contra Fuzil



Notas

[1] Roberto Ibáñez (1907-1978) foi um poeta uruguaio responsável por resgatar a vida e obra de diversos autores uruguaios de destaque, tendo trabalhado como pesquisador e professor da literatura nacional desse país.

[2] Programa de “ajuda” mútua desenvolvido pelos Estados Unidos na América Latina, cujo conteúdo, na prática, era uma forma de buscar contrapor a influência da Revolução Cubana no continente.

[3] Então delegado dos Estados Unidos.

[4] Em espanhol, essa expressão equivale a algo próximo de “em espécie”.

[5] Crescimento do Produto Interno Bruto com desconto da depreciação dos bens de capital construídos.

[6] Em espanhol, algo como fazer escândalo, protestar.

[7] Do latim, “condição {sem a qual não}[IT]” algo é impossível.

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