Disponibilizamos,
aqui, a segunda e última parte do artigo “Martí,
os cinco e defesa da pátria. Uma visão jurídico penal sobre o caso”, escrita pelo companheiro Yusuam,
presidente do Conselho Nacional do MJM, e publicada na Publicação Especial do MJM do dia 29 de novembro de 2014.
Traduzido pela equipe
do blog Fuzil contra Fuzil
Martí, os cinco e a
defesa da pátria. Uma visão jurídico penal sobre o caso. (Parte final)
Por Yusuam Palacios
Ortega, Presidente do Conselho Nacional do MJM
III. O Estado de
Necessidade no caso dos Cinco Heróis prisioneiros do Império
Uma das causas de exoneração de responsabilidade
penal, cuja presença elimina a ilicitude de um ato delitivo, é conhecida como Estado
de Necessidade. No caso dos Cinco, tal causa de exoneração de responsabilidade,
deveria ter sido aplicada, entretanto, há ai outra das tantas violações que se
cometeram contra nossos heróis. Nessa ordem, e para deixar claro que
tecnicamente a causa de exoneração de responsabilidade exposta deveria ter sido
apreciada; analisemos os requisitos da mesma de acordo com a conduta e a
situação objetiva que enfrentaram René, Ramón, Fernando, Antonio e Gerardo. Para começar, deixaremos bem claro que os Cinco atuaram
motivados por um inquestionável Estado de Necessidade; para evitar a
perpetração de atos terroristas, a morte de numerosas vidas, distintos crimes
organizados dentro dos Estados Unidos; eles, necessariamente, tinham que cometer delitos tais como a
falsificação de identidades e o não cumprimento do registro como agentes
estrangeiros. De outra maneira, não seria possível realizar as atividade que
fundamentam sua missão como agentes de segurança do Estado Cubano.
Foram, precisamente, o terrorismo e as ações hostis
dos Estados Unidos contra Cuba as que justificaram a missão cumprida pelos
Cinco Heróis, sua estada nos Estados Unidos, suas atividades como infiltrados
nos grupos terroristas, alertando a Cuba sobre a realização de ações terroristas
contra o povo cubano, planejadas e organizadas por esses grupos manipuladores e
inumanos. Essa é a razão da atuação dos Cinco, a necessidade de defender
milhões de seres humanos frente a um perigo, muitas vezes materializado durante
mais de 50 anos nos quais temos sido vítimas das mais terríveis ações
terroristas, patrocinadas pelas diferentes administrações do governo
estadunidense.
A hostilidade norteamericana, gostaríamos de
frisar, de maneira particular, apresenta uma característica transformou-se em
instrumento permanente da política exterior dos Estados Unidos em relação a
Cuba. Trata-se do terrorismo, cujas modalidades empregadas contra Cuba foram:
sabotagem ou destruição de objetivos civis dentro do país, ataques piratas
contra instalações costeiras, navios mercantes e embarcações pesqueiras,
atentados contra instalações e pessoal cubano no exterior, incluindo sedes
diplomáticas (...), a constante instigação a elementos subversivos, através de
emissoras de rádio e televisão, para realizar atos dessa natureza contra os
centros de produção e serviços (...) (1), explosões e incêndios de indústrias,
centros comerciais e recreativos, introdução de pragas e vírus no país,
colocação de bombas e artefatos explosivos em instalações turísticas, entre
tantas outras horrendas e odiosas ações; resultando em todos esse anos em mais
de 700 atos terroristas contra Cuba, 56 deles a partir de 1990, organizados e
financiados desde território norte-americano, com um saldo de 3478 mortos e
2099 incapacitados. (2)
Diante desses argumentos e o direito que todo
Estado tem de defender-se, levando em conta que não é permitido que nenhum cubano
se registre como agente de segurança de seu Estado no território dos Estados
Unidos, a conduta dos Cinco deixaria de ser anti-jurídica e, de fato, seriam
eximidos da responsabilidade pelos leves delitos cometidos. Vemos que os
requisitos do Estado de Necessidade são completamente preenchidos no caso dos
Cinco.
Assim, nesse caso, estamos frente a uma clara
situação objetiva de necessidade: a situação de perigo que constituem as
centenas de planos terroristas perpetrados contra Cuba, com os quais milhares
de vidas teriam sido perdidas, materializam a atuação necessária dos Cinco
quando cometeram alguns delitos com o objetivo de proteger um interesse
preponderante como a vida e integridade dos seres humanos que seriam vítimas
dos atos terroristas; assim como a integridade e segurança da nação cubana
posta em perigo, pelas odiosas tentativas e planos das organizações
anti-cubanas impunes no território estadunidense. A periculosidade contém o
elemento de gravidade que é derivado da própria essência das ações que os cinco
neutralizaram com sua atuação; ou seja, não se trata de um perigo leve, pouco
sustentável, carente da periculosidade requerida para armar conscientemente o Estado
de Necessidade. Por outro lado, a situação de perigo enfrentada pelos cinco foi
real; não era produto da imaginação nem da possível crença de que se pudesse
produzir o perigo, devido à iminência do perigo que representa a política
terrorista do imperialismo contra Cuba. Por conseguinte, não se pode ignorar a
inevitabilidade do perigo se não fosse feito o que fizeram os Cinco, pois de
outra forma não teria sido possível proteger o interesse preponderante antes
indicado.
O mal causado não é maior
do que o que se quer evitar
Esse requisito é essencial para o Estado de
Necessidade e consequentemente está incorporado ao caso em questão; pois mesmo
que os Cinco tenham cometido atos que se revestem de caráter delitivo, o mal
ocasionado com eles é muito inferior ao que poderia ter-se produzido se
chegassem a se materializar os atos de terror contra o povo cubano. A
falsificação de uma identidade ou o não registro como agentes cubanos não está
acima da vida e da integridade dos homens e mulheres do povo cubano. As
principais acusações imputadas aos Cinco e pelas quais se recorre ao Estado de
Necessidade são os seguintes: o uso de identidade falsa e a conspiração para
atuar como agente estrangeiro não registrado. Como propôs Weinglass: “A maioria
dessas acusações está relacionada com a criação e uso de identidades falsas por
parte dos Cinco (...)” (3) - esclarecemos que René e Antonio, como têm
cidadania norte-americana, atuavam sob seus nomes legais – alegando-se nas
restantes acusações que: “(...) os Cinco descumpriram sua obrigação de se
registrarem com o Fiscal Geral dos Estados Unidos como agentes estrangeiros
conforme estabelece a lei”. (4) Não cabem dúvidas de que frente essas acusações
inferiores, em relação ao o que os Cinco protegiam, estaria justificadas suas
respectivas ações.
O perigo não pode ser provocado pelo sujeito
Deveríamos perguntar: por acaso foram os cubanos
que provocaram as ações terroristas contra Cuba? Evidentemente, isso seria
absurdo, ainda mais se consideramos que esse Estado de Necessidade não era para
proteger um interesse pessoal, mas sim coletivo, nem para proteger um bem
particular, senão a segurança de toda uma nação. Sobram elementos e são
suficientes as razões para demonstrar que os círculos de poder norte-americano historicamente
empreenderam contra Cuba uma política encoberta, caracterizada pelo terror e totalmente
criminosa. Aqui vemos um requisito primordial para enquadrar a situação ou o
direito de necessidade: o sujeito atua motivado por um perigo que o precede, tão
real e inevitável que a ele não resta outra opção que ocasionar situações de
menor gravidade para eliminar a situação perigosa.
Ausência do dever de
sacrifício
Levando em consideração que algumas pessoas
motivadas por sua posição, ofício ou profissão estão submetidas ao dever de
assumir certos riscos, isso não permite que se refira a esse sacrifício como um
Estado de Necessidade, pois sua ação igualmente se justifica por ter que
garantir proteção ainda e quando se lesem outros bens. Esse não é o caso dos
Cinco, pois mesmo que pudéssemos alegar que eles cumpriam com seu dever, esse
dever não era jurídico, imposto por uma norma que os obrigava a afrontar essa
situação perigosa devido à sua posição ou ofício. (5)
Em nossa consideração estão dados os requisitos para
eximir a responsabilidade penal dos Cinco Heróis devido ao Estado de
Necessidade. Entretanto, esse foi negado por parte do Tribunal responsável, que
não permitiu ao júri (6) que considerasse a defesa da necessidade como
justificativa para a ação dos Cinco, mesmo que a defesa tenha apresentado cerca
de 30 documentos onde se provava a longa lista de ações terroristas sofridas
pelo povo cubano, e como foram perpetradas, idealizadas e financiadas desde
território norte-americano pela máfia de Miami. Mas como ocorreram os fatos
desde o ponto de vista processual? De acordo com o professor Fernández
Bulté: “Sobretudo, é evidente que as acusações imputadas aos acusados foram aniquiladas,
uma a uma, por seus advogados defensores e no curso dos debates ficou claro que
os acusados haviam servido exclusivamente ao governo cubano na nobre função de
penetrar em organizações terroristas radicadas em Miami, exercendo seu direito
de defender a soberania do povo cubano, configurando assim uma causa de
justificação que no Direito Penal se conhece como Estado de necessidade, ao
poder conhecer e frustrar planos terroristas contra Cuba”. (7)
A defesa dos Cinco postulou, em virtude das
próprias leis estadunidenses, a defesa do estado de necessidade que “(...)
estipula que se pode violar uma lei (frequentemente de caráter técnico e que
não cause danos aos indivíduos ou à propriedade) se o motivo da violação é
evitar um dano maior.” (8) Como apontado anteriormente, a juíza não permitiu
que o júri avaliasse a exoneração de responsabilidade, ao negá-la, de antemão,
quando foi solicitado pela defesa. É bem clara e precisa a lei norte-americana
quanto à doutrina de estado de necessidade: “(...) se alguém atua para prevenir
um mal maior, inclusive se ele/ela viola a lei durante o processo, será
justificado qualquer ato criminal, devido a que a sociedade reconhece a
necessidade – inclusive o benefício – de levar a cabo tal ação” (9) A partir
disso que consideramos como mais uma violação a negação, por parte da Corte,
dessa defesa, e a não instrução do júri dessa mesma defesa com o objetivo de
que os Cinco fossem absolvidos, em virtude da necessidade que justificava sua
ação. É necessário dizer que a Corte limitou, em primeiro lugar, a evidência da
defesa a um período de tempo bem estreito (de 1992 a 1998) ignorando as décadas
de terrorismo e de hostilidade dos Estados Unidos contra Cuba; ainda que esses
6 anos foram mais suficientes para sustentar a defesa da necessidade. Logo a Corte
tomou a indignante decisão de tirar do júri o direito de absolver os Cinco
sobre a base do Estado de Necessidade, violando dessa forma, novamente, o
principio do devido processo legal e inclusive até a própria Quinta Emenda da Constituição
dos Estados Unidos. (10)
Conclusões
Como se pode constatar, esse processo judicial
contra os Cinco Heróis se transformou em uma indignante manipulação política,
de onde vem seu caráter fraudulento e sujo, carente de qualquer respeito à
legalidade, à constitucionalidade, à princípios universalmente reconhecidos,
aos direitos humanos de cinco homens dignos e de seus familiares, vítimas
também do ódio contra Cuba pela máfia e pelo pérfido governo norte-americano.
Era de esperar e perfeitamente entendível que negassem e subestimassem o Estado
de Necessidade, como causa que eximiria aos Cinco da responsabilidade penal,
pois eles deviam ser condenados a todo custo, pois assim se estava condenando
toda a nação cubana, seus líderes históricos e seu heróico povo. Agora, que
foram sentenciados novamente três deles, após a Corte Suprema ter-se negado a
revisar o caso do ano passado (11), quando já temos entre nós René e Fernando,
após terem cumprido sua sentença; a luta de liberação se mantém em cada canto
do mundo, continuamos convencidos, como o Comandante em Chefe, de que os três
que restam, cedo ou tarde, voltarão.
1.
Demanda do Povo de Cuba ao governo dos Estados Unidos por danos humanos e
materiais.
2.
Ibidem
3.
Weinglass, Leonard: “El proceso judicial
contra los Cinco Cubanos” em Terrorismo
de Estados Unidos contra Cuba. El caso de los Cinco. editorial José Martí,
2005, pág. 133.
4.
Ibidem, pág. 134.
5.
Nas palavras do professor Quirós: “Se fala do cumprimento de um dever, na
esfera do Direito Penal, quando alguma pessoa é obrigada a se comportar de
determinada forma porque uma norma jurídica o impõe em razão de suas funções ou
de suas atividades laborais, mesmo que em tal comportamento se incorra no
cometimento de um delito”.
6. O júri constitui um elemento
essencial no sistema de justiça da Common Law pois a determinação que o mesmo
estabelece sobre os fatos que ocorreram é fundamental. O objetivo do
procedimento judicial com a presença de jurados consiste em selecionar pessoas
que não saibam os fatos que se imputam, de tal modo que as partes possam
introduzi-los a través de provas para que em seguida o júri, valendo-se das instruções
do juiz, estabeleça os reais acontecimentos. Daí que a procura desse júri seja
tão importante dentro da Common Law, e evidentemente, com a garantia que o júri
seja totalmente imparcial.
7. Fernández
Bulté, Julio: Violaciones legales en el proceso seguido contra los Cinco Héroes
prisioneros del Imperio, tomado de Colección Jurídica No.13, marzo-abril 2002.
(Edición electrónica).
8.
Weinglass, Leonard: El proceso judicial contra los Cinco Cubanos, en Terrorismo
de Estados Unidos contra Cuba. El caso de los Cinco, editorial José Martí,
2005, pág. 133.
9.
Retirado
de Atlanta y el caso de los Cinco. La
larga marcha hacia la justicia, Editora Política, La Habana, 2005, pág. 20.
10. “Ninguém será
obrigado a responder por um delito castigado com a pena capital ou com outra
infamante se o gran jurí não o denunciar ou acusar, exceto nos casos em que
façam parte das forças do mar, terra, ou da milícia nacional quando se encontre
em serviço efetivo em tempo de guerra ou perigo público; tampouco se colocará
pessoa alguma duas vezes em perigo de perder a vida ou algum membro com motivo
do mesmo delito; nem será compelido a declarar contra si mesma em nenhum julgamento
criminal; nem se privará a vida, a liberdade ou a propriedade sem devido
processo legal; nem se ocupará a propriedade privada para uso público sem uma
justa indenização.” (Ver Constituição dos Estados Unidos)
11. Refere-se ao ano de
2013. (Nota do Tradutor)
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