A
luta das mulheres cubanas já é registrada desde a luta pela independência do
país. No século XIX, ainda sob domínio espanhol, inicia-se em Cuba um movimento
independentista, que lutava contra a escravidão e a colonização. Nascida em
Santiago de Cuba, em 1815, Mariana Grajales Cuello foi uma das primeiras
mulheres que lutou pela liberdade de seu país, teve treze filhos e foi com a
maioria deles embora de sua cidade para juntar-se à luta. Criou os Maceos, para
lutarem pela independência, combatentes de destaque. Seu filho Antônio Maceo foi o maior general
do Exército Libertador e era reconhecido pelas suas táticas militares.
Junto
com seus filhos e netos, Mariana Grajales organizou um lugar de apoio para os
combatentes cubanos, fornecendo comida, remédios, descanso, banho e o que mais
precisassem,1 além de ajudar a resgatá-los quando atingidos nas
batalhas. Martí,2 quando viu-a com Maria Cabrales, mulher
de Antônio Maceo, entrar no campo de batalha para recolher Maceo ferido, disse:
“É fácil ser herói com mulheres como
essas”.
Por
ter dedicado sua vida à luta, Mariana é até hoje considerada em Cuba como
exemplo de mãe. Em janeiro de 1894, Martí escreveu no jornal Pátria:
“Muitas vezes, sem que tivesse esquecido do meu
dever de homem, teria voltado a ele com o exemplo daquela humilde mulher, que
santidade e unção houve em seu seio de mãe, que decoro e grandeza houve em suas
simples vida, que quando se escreve dela é como a raiz da alma, com suavidade
de filho, e com estranho afeto? O quê, a não ser a unidade da alma cubana,
feita na guerra, explica a ternura unânime e respeitosa, e os sotaques de
indubitável emoção e gratitude, com que quantos tem pena e coração tem-se
manifestado sobre a morte de Mariana Grajales, a mãe de nosso Maceo?”; “Pátria
- assinou Martí, além disso - na coroa que deixa na tumba de Mariana Maceo,
coloca uma palavra: Mãe!”.
Mariana morreu em 1893 sem ver Cuba independente dos espanhóis.3
A partir
da independência cubana, o movimento das mulheres se desenvolve como no resto
do mundo ocidental. Em 1918, as mulheres sufragistas organizaram o “Clube
Feminino de Cuba”, essa organização fundou escolas noturnas para as
trabalhadoras e a primeira escola para meninas no país. Por iniciativa delas é
criada a Federação Nacional de Associações Femininas de Cuba, em 1921, que reunia
o Clube Feminino de Cuba, o Congresso Nacional de Mães, a Associação das
Católicas Cubanas, a Associação Nacional de Enfermeiras e o Comitê da Creche
Havana Nova. O Primeiro Congresso de Mulheres é realizado em 1923, pela
Federação. No congresso clamaram pelo direito ao sufrágio, igualdade de
direitos e deveres sociais, políticos e econômicos, combate às drogas e à
prostituição, leis protetoras das crianças e modificação do ensino médio. O
direito ao voto universal é conquistado em 1934.
Em
1952, com um golpe, Fulgencio Batista chega ao poder, instaurando uma ditadura
associada aos interesses estadunidenses. A partir disso, surgem em Cuba mais de
29 organizações femininas de caráter político-social e assistencial, juntamente
com outras organizações, armadas, majoritariamente masculinas, que lutavam
contra a tirania. Foi através da FEU (Federação dos Estudantes Universitários)
que muitos estudantes (homens e mulheres) ingressaram na luta, mesmo os de
ensino médio, que na época não possuíam um órgão de representatividade. Na FEU
cria-se o Diretório Revolucionário 13 de Março, um aparato político dos
estudantes para desenvolver a luta armada. Em 1956, José Antonio Echeverría,
comandante do diretório e presidente da FEU, firma com Fidel Castro “A Carta do
México”, pela qual o Movimento 26 de Julho e a Federação Estudantil
Universitária – Diretório Revolucionário se comprometiam unir esforços para
acabar com o regime.
Dentre
as organizações femininas, uma de maior destaque foi a Frente Nacional de
Mulheres Martianas (FCMM). O grupo revolucionário se organizou meses depois do
golpe com o objetivo de pôr fim da ditadura mediante a revolução armada e a
instalação do poder popular e se estender por quase todo o país, agindo muito
próximo ao Movimento 26 de Julho. As mulheres já haviam organizado
anteriormente o Frente Cívico de mulheres cubanas e o Frente Cívico de Mulheres
Martianas. Desde o início do processo revolucionário, as revolucionárias em
suas organizações realizaram atividades de mensageiras, enfermeiras, secretárias,
transportavam comidas e combatentes entre as cidades e para a Sierra Maestra,4
distribuíam manifestos e informativos, arrecadavam dinheiro, ajudavam a
construir armamentos, transportavam armas, munições; com o tempo aprendiam a
armar bombas, fazendo trabalho de sabotagens, também escondendo companheiros em
suas casas. As moças mais novas, de 15, 16 anos, vestiam-se de forma mais
infantil, assim, além de serem menos suspeitas, quando eram presas, os soldados
soltavam-nas logo, por serem apenas “crianças”.
Grande
parte das revolucionárias tinha sido criada por pais e mães que concordavam com
o combate. María Yolanda Alfonso Pérez (nasceu em 1933, foi membro do Diretório
Revolucionário, membro da Frente Cívico de Mulheres Cubanas e colaborou com o
Movimento 26 de Julho), por exemplo, ia com sua mãe nos movimentos. Ela relata:
“(...) minha mãe havia lutado contra
Batista em seu primeiro mandato. Foi para a Espanha comigo criança e enfrentou
a ditadura de Franco. Me pus a conspirar contra Franco e contra todo mundo”.
Outro caso parecido é o de J. Magaly Martínez Pérez (nasceu em 1938,
era membro do Diretório Revolucionário e do Movimento 26 de Julho.). Seu pai lutou
na Guerra da Independência com 15 anos e desde pequena conversavam sobre
combates em sua casa. Hildelisa Esperón Lozano (nasceu
em 23 de dezembro de 1940, era membro da Frente Cívico de Mulheres Martianas,
do Movimento 26 de Julho em Ação e Sabotagem e colaborou com o Diretório Revolucinário) e sua mãe são mais um exemplo. Hildelisa
disse aos onze anos de idade “É melhor
que venham os americanos que ter um Batista”,5 sua mãe respondeu
“Não, não, não, aqui não tem que vir
ninguém, aqui o que temos é lutar”.
Por
outro lado, quando os pais não estavam a favor, geralmente os de família mais
rica, as meninas precisavam trabalhar escondidas da própria família,
dificultando ainda mais o processo. O que mais impedia a luta das mulheres,
principalmente para as mais novas, era a proteção constante sob a qual estavam
na época: não era certo uma moça andar acompanhada de rapazes, ou ir a reuniões
sozinha com homens; por isso, eram importantes as mães que contribuíam e
acompanhavam suas filhas. A vantagem de serem mulheres é que levantavam menos
suspeitas, o que ajudava nos trabalhos clandestinos. Mesmo quando já estavam
dentro do movimento revolucionário, algumas se incomodavam da super proteção
que seus próprios companheiros tinham com elas. María Dolores Matamoros Labrada
(membro da Frente Cívico de Mulheres Martianas, do Movimento 26 de Julho,
tendo colaborado com o Diretório Revolucionário) relata: “Nós tínhamos que lutar nesse meio. Eu
considero que desenvolvemos três lutas: A luta pelos ideais, que foi a primeira
e que estou lhes contando agora; a luta contra a família e a luta contra os
preconceitos com a mulher.” 6
Apesar
de contribuírem, foram poucas mulheres que já no início participaram da luta
armada, entre elas está Haydée Santamaría Cuadrado (1922-1980) que participou
ativamente do assalto ao quartel Moncada, liderado por Fidel Castro em 26 de
julho de 1953.7 Depois desse assalto, muitos combatentes foram
capturados pelo exército de Batista, como Fidel, Haydée e seu irmão e marido,
que foram torturados e assassinados. No discurso “A história me absolverá”,
Fidel relembra:
“Com um olho humano ensanguentado em mãos, apresentaram-se um sargento e
vários homens no calabouço onde se encontravam as companheiras Melba Hernández
e Haydée Santamaría e, dirigindo-se à última, mostrando-lhe o olho, lhe
disseram: "Este é de seu irmão, se você não diz o que ele não quis dizer,
vamos arrancar-lhe o outro." Ela, que amava a seu valente irmão acima de
todas as coisas, lhes respondeu cheia de dignidade: "Se vocês lhe
arrancaram um olho e ele não lhes disse, muito menos o direi eu." Mais
tarde voltaram e as queimaram nos braços com cigarros acesos, até que, por fim,
cheios de desespero, lhe disseram novamente à jovem Haydée Santamaría: "Já
não tens seu companheiro, porque o matamos também." E ela respondeu-lhes,
imperturbável, outra vez: "Ele não está morto, porque morrer pela pátria é
viver." 8
Em
1954 sai da prisão e começa a articular o movimento revolucionário, com o
pseudônimo de Maria. Outra revolucionária de destaque foi Célia Sanchéz, com o
codinome de Norma ou Aly, fundadora e dirigente do Movimento 26 de Julho,
participou do Partido do Povo Cubano9 junto a Fidel quando jovem.
Célia não participou do assalto ao quartel, mas, logo após, começou a organizar
campanhas financeiras para ajudar os prisioneiros e as famílias. Além disso,
juntamente a Frank País10, articulou uma rede de apoio à guerrilha, através
da qual foi possível que os doze homens sobreviventes do Granma11 formassem
em pouco tempo um forte Exército Rebelde. Se o Granma tivesse desembarcado no
local combinado, teriam encontrado dezenas de homens com caminhões para
levá-los a Sierra Maestra, organizados por Célia. Em 1957, foi para Sierra
Maestra, sendo a primeira mulher a participar do Exército Rebelde. Em 1958,
forma junto com outras revolucionárias de destaque, como Haydée e Melba
Hernandéz, o Pelotão Mariana Grajales, exclusivamente feminino.
Ainda é necessário citar Vilma Espín
que, através de Frank País, ingressou à luta no Movimento 26 de Julho.
Estudando nos EUA, quando regressava, por ordem do movimento, fez uma escala no
México, onde conheceu Raul e Fidel. Quando volta para Cuba, é nomeada
coordenadora do Movimento 26 de Julho da província do Oriente, com o pseudônimo
de Mônica, por Frank País dias antes do seu assassinato. A mulher de Frank País
era América Domitro
Terlebauca, sua família concordava com os ideais da Revolução de Outubro
em 1917, saíram da Ucrânia e foram para Cuba em 1931. América participava da
luta, transportando armas e uniformes. Quando Fidel Castro desembarcou do
Granma, América foi junto com Vilma, Asela de los Santos, Graciela e Mirta
Aguiar transportar Fidel em segurança.
A
revolução triunfa em 1 janeiro de 1959, sendo importante o papel das
organizações revolucionárias e estudantis, que foram e são essenciais para a
formação da unidade do povo cubano. Vilma Espín funda em agosto de 1960 a
Federação de Mulheres Cubanas, unificando todas as organizações femininas que
lutaram pela revolução.
Notas:
1. Essas informações constam nos testemunhos do
comandante Francisco Arno, que lutou ao lado de Mariana Grajales.
2.
Foi o líder da luta pela independência de Cuba.
3.
Cuba se tornou independente em 1898.
4.
Sierra Maestra foi o local onde lutou a guerrilha liderada por Fidel.
5.
Las mujeres en la insurrección 1952 - 1961 (As mulheres na insurreição 1952 - 1961)
6.
op. cit.
7.
Ação que deu nome ao posterior Movimento 26 de Julho.
8.
Nesta fala, Haydée se remete a um verso do hino de Cuba.
9.
Também conhecido como Partido Ortodoxo, incluía os trabalhadores e fazia frente
ao sistema de exploração capitalista neocolonial. Fidel considerou o partido
limitado e começa a organizar um outro movimento.
10.
Revolucionário cubano que organizou a Frente Oriental
11.
Iate que trouxe 82 combatentes do México, entre eles Fidel Castrou e Raul
Castro. Logo que chegaram, foram atacados, restando apenas 12 combatentes.
Equipe do blog Fuzil contra Fuzil
Equipe do blog Fuzil contra Fuzil
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